por Ricardo Coiro
E assim, mais uma vez eu morri. Padeci bem diante
de suas bochechas rubras e molhadas pelas urticárias lágrimas recém derramadas.
Morri mudo, arrependido por novamente ter feito você chorar, depois de tanto ter
repetido que eu não mais a faria desabar dessa forma. Morri ali parado,
perplexo, congelado e sem saber qual antídoto usar para combater meu próprio
envenenamento. Morri calado, sem saber como reverter o fluxo de água salgada
que dos seus olhos despencava, e claro, sabendo que aquela tempestade dentro de
ti rasgava e esfolava sua alma feito o fio do vidro mais afiado.
Morri sem forças para dizer que naquele momento
eu seria capaz de enfrentar tudo, menos essa mortal sensação gerada pela
tristeza que causei em quem mais queria ver a alegria estampada na face. Morri
por não saber como agir diante de minha própria destruição. Morri quando
percebi que não havia desculpa capaz de costurar o corte profundo que havia
feito em seu belíssimo coração de cetim vermelho. Morri quando em seu
olhar esguio, vi que aquele seria nosso último brinde de retinas.
Graças aos seus olhos marejados, pude claramente descobrir a identidade do
assassino desse nosso romance e esse vilão, era eu.
Sei que não há desfibrilador capaz de ressuscitar
aquelas tardes de Domingo, nas quais víamos um DVD atrás do outro e só
pausávamos o filme, para dizer que quando estávamos juntos, o movimento de
rotação da Terra também parava. Sei que não há dose cavalar de
adrenalina capaz de fazer nosso amor pulsar novamente, não com a mesma
pressão que em nossas veias bombeou um dia. Sei que nada reverterá o estrago
causado pela minha mentira por ti engolida com sensação de navalha. Sei que
nada reconstruirá o imenso castelo que derrubei com apenas um tropeço com
caráter claro de desastre.
Portanto, com um nó indesatável na garganta e em
meio ao pranto que agora me estupra de dentro para fora, deixo aqui, nessa
carta, aquilo que não fui capaz de dizer enquanto você soluçava e ajoelhava
graças à visivelmente insuportável dor emocional. Deixo aqui, nesse bilhete, a
única herança que um monstro como eu pode deixar a ti, meu amor despedaçado:
Deixo aqui meu sincero e só agora possível pedido
de desculpas: perdão por ter morrido antes que pudéssemos viver nossos
planos. Perdão pela minha já certa ausência no próximo dia dos
namorados e pelas tantas vezes que terá que ouvir alguém da sua família
perguntando de mim. Diga a eles que eu morri, não invente que não pude ir.
Perdão por ter feito você soluçar e por ter
matado a confiança plena, que um dia teve na pureza de minhas palavras.
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